O objetivo deste trabalho é trazer à discussão o modo quase hegemônico como o homem na modernidade, lançando mão dos inúmeros avanços tecnológicos conquistados pela ciência, lida com o anúncio da morte, de modo a adiá-la a qualquer preço, sob a máxima de que a vida deve ser prolongada, mesmo à custa de todo e qualquer sofrimento. Heidegger, em sua obra Ser e Tempo, esclarece o modo como o homem na cotidianidade mediana lida com a morte. O homem se movimenta na nossa época, denominada por Heidegger de era da técnica, era esta em que, segundo o filósofo, o mundo é desvelado como fundo de reservas por meio da máxima do controle dos entes e da existência. A morte, tal como compreendida na cotidianidade mediana, passa a ser um fenômeno passível de adiamento, sobre o qual podemos ter controle e que, ao modo impessoal, encontra-se sempre referida à morte do outro. Ao tomar o fenômeno da morte ao modo do impessoal, Heidegger acena que acabamos por obscurecer aquilo que lhe é mais próprio, ou seja, seu caráter irremissível, certo, indeterminado e insuperável. Buscaremos a concepção do autor sobre a morte como indissociável da existência e discutiremos como, na maioria das vezes, o homem movimenta-se no horizonte da técnica em meio à impessoalidade, lidando com a morte de modo impróprio e encobrindo essa possibilidade. Para tanto, iremos apresentar como a lida com a morte, na modernidade, encontra-se mediada pelos saberes especializados, a partir dos quais se procura combater, gerenciar e controlar este fenômeno. Apontaremos alguns dilemas que confrontaram a medicina e a sociedade diante dessa tentativa e buscaremos compreender como estes saberes foram construídos historicamente. Para desvelar outras possibilidades de lida com a morte, buscaremos na Grécia antiga, através da análise de mitos, o modo como o grego do ciclo épico lidava com este fenômeno. Retornando ao homem grego do ciclo épico, mostraremos que as verdades sobre a lida com a morte, que se estabeleceram como absolutas no mundo atual, podem ser colocadas em questão e apontaremos a pertinência de pensarmos a morte para além da lógica de modelos atuais que buscam gerenciar este fenômeno. Recorreremos, finalmente, ao texto Serenidade, de Heidegger, para examinar o pensamento do homem moderno e refletir sobre as suas incessantes investidas na busca pelo controle e pelo gerenciamento da morte. Através do pensamento reflexivo, proposto pelo autor, acreditamos que se desvelam outras possibilidades de lida com a morte, antes obscurecidas por verdades tomadas como absolutas, e, deste modo, torna-se possível conquistar uma relação mais livre com este fenômeno
The objective of this work is to discuss about the almost hegemonic way that man in modernity deals with the announcement of the death, making use of numerous technological advances made by science for postponing it at any price, under the maxim that life should be prolonged, even at the expense of any suffering. Heidegger, in his work Being and Time, clarifies how the man deals with death. The man moves in the age we live in, called by Heidegger Age of technique, age in which, according to the philosopher, the world is unveiled as fund reserve through the maxim of control over beings and existence. As understood in our everyday lives, death becomes a phenomenon liable to postponement, over which we have control and, using an impersonal manner, we always refer to other s people death. By taking the phenomenon of death in an impersonal manner, Heidegger shows we had just obscured what is most proper to it: its inevitable, fateful, indeterminate and insuperable character. We will use the author's conception of death as inseparable from the existence and discuss how, in most cases, the man moves on the horizon of the technique through the impersonality, dealing with death improperly, covering up this possibility. To this end, we will present how dealing with death in modernity is mediated by specialized knowledge, from which we seek to combat, manage and control this phenomenon. We will identify some dilemmas that confronted medicine and society in its tentative. Then we will seek to understand how this knowledge was historically constructed. To unveil other possibilities for dealing with death, we will seek in ancient Greece, through the analysis of myths, how the Greek man of the epic cycle dealt with this phenomenon. Returning to the Greek man of the epic cycle, we will show that the truths about dealing with death, which were settled as absolute in the present world can be called into question and we will point out the relevance of thinking about death beyond the logic of current models which seek to manage this phenomenon. We will resort to Heidegger s text Serenity to examine modern thinking and reflect on its incessant rush in search, control and management of death. Through reflective thought, proposed by the author, we believe that other possibilities for dealing with death are unveiled, previously obscured by absolute truths, and thus it becomes possible to achieve a more free relationship with this phenomenon