O presente estudo consiste em uma crítica à historiografia tradicional sobre a tortura a partir da perspectiva genealógica de Michel Foucault. Baseados neste autor, consideramos que para traçar a história das práticas de tortura é preciso traçar a história política das transformações dos métodos punitivos em correlação com uma tecnologia política do corpo. Por esse caminho entendemos que a emergência da tortura está sempre vinculada às relações de poder/modos de governo (de si e dos outros), que se apresentam de diferentes formas ao longo da história. Para alcançar essas diferenças efetuamos um mapeamento das descontinuidades em torno da prática da tortura no período que vai do século XII ao XXI. Nossas análises foram distribuídas a partir dos três modos de governo apontados por Foucault: poder soberano, poder disciplinar e biopoder. O campo de problematização engendrado por esse olhar genealógico facultou pensar a tortura de três modos principais e nem sempre mutuamente exclusivos: a tortura legitimada pelo poder real; a tortura supostamente abolida e efetivamente redistribuída nas sociedades disciplinares; a tortura utilizada como uma tecnologia biopolítica de governo das condutas - dos regimes ditatoriais aos democráticos -, em que fazer viver e deixar morrer são duas faces de uma mesma moeda. Apontamos variados segmentos populacionais que têm sido alvo do governo das condutas mediante a prática da tortura, mas demos destaque especial ao segmento da infância, em função de ele aparecer de forma intensa e recorrente em nossa história.
This study consists of a critique to the traditional historiography on torture from the genealogical perspective of Michel Foucault. Based on this author, we believe that to trace the history of torture is necessary to draw the political history of the transformations of punitive methods in correlation with a political technology of the body. In that way we believe the emergence of torture is always bound to the relations of power/modes of government (of itself and others), which are presented in different ways throughout history. To achieve these differences we carried out a mapping of discontinuities around the practice of torture in the period from the century XII to XXI. Our analyzes were distributed from the three modes of government pointed out by Foucault: sovereign power, disciplinary power and biopower. The field of problematic engendered by this genealogical look has allowed thinking the torture in three major ways, and not always mutually exclusive: torture legitimized by the real power; torture supposedly abolished and effectively redistributed in disciplinary societies; the torture used as a bio-politics technology of government of behaviors - from dictatorial regimes to democratic ones -, in which to live and let die are two sides of the same coin. We pointed out various population segments that have been target of the government of the conducts through torture practice; however, we gave special attention to the childhood segment, due to it appears in an intense and recurring basis in our history
