Nessa pesquisa, procuramos nas narrativas antigas (gregas e romanas) a sua construção retórica, como possibilidade de acesso a uma ordem simbólica que tem sua autonomia e seu poder explicativo dentro de horizontes determinados historicamente. Como uma estrutura mãe, a retórica reúne imanência e transcendência Ela dá forma não somente à linguagem, como à conduta dos homens. Fornece também os instrumentos necessários para que os homens percebam suas próprias representações. Interrogamos, então, o contraste entre as epopéias homéricas e as tragédias gregas do século V como um caminho de análise retórica que se abre à compreensão das novas necessidades impostas pela experiência política. A retórica põe em circulação e faz durar as tradições e notadamente as tradições literárias. Que importam nesse projeto. Certamente as tragédias não substituíram as epopéias, mas permitiram que o alargamento político, criado pela democracia ateniense, exigisse novas formas de lidar sua tradição mítica. Tentaremos, assim, articular a matéria literária em suas diferentes formas e avaliar como serviram e construíram algum tipo de aprendizado. No caso do teatro trágico ateniense, apostamos que o alargamento da participação política e suas decisões vinham acompanhados da necessidade de algum tipo de aprendizado. O recurso da retórica como instrumento de compreensão teria o mérito de evitar toda projeção arbitrária dos esquemas atuais sobre um passado que sabia muito mais sobre si mesmo do que nós. Como arte da persuasão, a retórica atravessa o social, o político e o religioso compreendendo totalmente o fenômeno humano sem romper suas ligações com a filosofia, o direito, a moral e a teologia. Como arte da memória, ela religa as palavras às imagens, ela revisita os predecessores, registra os textos clássicos e organiza a experiência dos homens, como sugere Marc Fumaroli em seus trabalhos sobre a arte retórica.